Venezuela: situação se agrava

A Venezuela vive uma grave crise econômica, política e humanitária, decorrente especialmente da queda do preço do petróleo, do qual sua economia depende há cerca de 60 anos. O parlamento dominado pela oposição já não tinha poder de tomar decisões válidas, pois desobedecia determinações judiciais, especialmente por ter dado posse a quatro deputados cuja eleição havia sido anulada. A oposição não reconhecia essas decisões, pois os 4 parlamentares lhe dariam poder para alterar a Constituição de 1999, cuja validade ela nunca reconheceu.

Semana passada, foi eleita uma nova assembléia constituinte, sem a participação da oposição — que passou a jurar defender a Constituição de 1999, que ela mesma revogou em 2002, quando obteve o poder por 3 dias, por meio de um golpe militar. Apesar dos apelos, inclusive da Santa Sé,  o governo resolveu continuar com o processo, instalando a constituinte. Naquela mesma semana, o governo americano declarou que faz de tudo para destituir o presidente Nicolás Maduro.

No domingo (6), ao menos um ex-militar, expulso das forças de segurança por participar de um golpe frustrado em 2014, promoveu um levante junto com alguns civis e assaltou o quartel onde fica a principal base de veículos blindados da Venezuela, levando consigo 93 fuzis AK-103 e quatro lança-granadas.

Ontem (8), o Palácio Legislativo da Venezuela foi totalmente tomado pela nova Assembleia Nacional Constituinte, proibindo-se a entrada dos parlamentares da Assembleia Nacional Bolivariana. No mesmo dia, a Constituinte se declarou acima de todos os poderes venezuelanos. Ainda no dia 8, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos divulgou nota em que afirma o uso desproporcional da força e a tortura contra manifestantes da oposição — apesar de que a metodologia pode ter fornecido um retrato ainda pior do que a situação real, inclusive ignorando os atos de terrorismo praticados pela oposição, como o lançamento de granadas contra o Tribunal Supremo de Justiça e o uso de bomba contra a Guarda Nacional Bolivariana.

https://youtu.be/8JajYVEALes

Opinião de Visão Católica

É urgente restabelecer o diálogo no seio da sociedade venezuelana. A oposição, marcadamente os proprietários do capital e a classe média, nunca se conformaram com a Constituição de 1999, com a lei de hidrocarbonetos (petróleo e gás natural) e com a perda das benesses da administração do tesouro nacional. Nos três dias em que estiveram no poder em 2002, por meio de golpe revertido pela mobilização popular e por parte das forças armadas, revogaram a Constituição, a lei de hidrocarbonetos, a lei de pesca e o acesso universal à saúde.

Depois, promoveram um locaute (greve patronal) e se recusaram a participar das eleições, deixando o chavismo dominar o parlamento praticamente sozinho. Frustradas as iniciativas, voltaram às eleições, e, com a crise decorrente da queda do preço do petróleo, obtiveram ampla maioria na Assembleia Nacional Bolivariana. Não se contentaram com a simples maioria, deram posse a 4 deputados cuja eleição havia sido anulada devido a irregularidades — queriam garantir para si o poder de alterar a Constituição que nunca aceitaram. Desde então, nenhuma decisão do parlamento é considerada válida, por determinação do Tribunal Supremo de Justiça.

Em 2014 e agora, em 2017, protestos violentos marcaram a sociedade venezuelana. A violência parte de ambos os lados. No Brasil, por muito menos as forças armadas foram enviadas para impedir protestos em Brasília, ainda este ano.

Por outro lado, o governo também eleva a tensão social, em vez de promover o diálogo. Quando a Santa Sé tentou promovê-lo, o governo até tentou participar e firmou compromissos para distender a sociedade. Diante da negativa da oposição, retrocedeu. Agora, com a sociedade profundamente dividida e radicalizada, a instalação da Constituinte, mesmo que legal, acirra ainda mais os ânimos, sendo motivo de piora da situação.

O que os católicos podemos fazer? Penso que rezar para que as autoridades promovam o diálogo e a conciliação, mas também promover a construção de pontes entre as partes, reconhecendo que ambas têm um lastro social importante, que há verdadeiramente uma crise grave na Venezuela, e conclamando ao respeito pelo próximo, inclusive a sua opinião política. Todos os lados estão errados em alguma medida, mas não são por isso menos representativos de partes da sociedade venezuelana — é preciso reconhecer a legitimidade de ambos.

(Imagem em destaque: quadro de vídeo da sublevação em Paramacay.)


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